SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O líder opositor russo Alexei Navalni, 47, está morto. O mais conhecido crítico do governo de Vladimir Putin estava preso em uma cadeia na remota região de Yamalo-Nenets, no Ártico, e cumpria 30 anos de pena por condenações diversas.
A morte foi anunciada pelo Serviço Federal Prisional da Rússia, e até agora as causas não foram reveladas. Em nota, o órgão disse que Navalni "se sentiu mal após uma caminhada, perdendo quase imediatamente a consciência".
"A equipe médica da instituição chegou imediatamente, e uma ambulância foi chamada. Todas as medidas de ressuscitação foram tomadas, sem resultado positivo. A causa da morte está sendo estabelecida", completa o texto,
O jornalista independente russo Dmitri Muratov, que ganhou o prêmio Nobel da Paz em 2021, disse que o opositor foi "assassinado". Ele atribuiu a morte às condições de sua prisão. Na mesma linha foi o ex-oligarca Mikhail Khodorkovski, que passou três anos preso após entrar em rota de colisão com Putin nos anos 2010.
Ao longo de sua detenção, o ativista fez greves de fome e teve uma deterioração acentuada de suas condições de saúde, o que seus advogados creditavam aos períodos de isolamento em solitárias, má nutrição e tortura psicológica. O próprio Navalni, em uma mensagem recente, dizia que era acordado por músicas nacionalistas pró-Putin.
O Kremlin disse que o presidente foi notificado da morte, mas a assessora de Navalni, Kira Iarmich, afirmou no X que nem a família nem os colegas do ativista foram notificados. Um advogado está a caminho de Kharp, onde fica a Unidade Prisional 3, onde estava preso Navalni.
O opositor considerava suas condenações meros artifícios de perseguição política, e no fim do ano passado seu sumiço da colônia penal onde estava preso perto de Moscou causou apreensão. Ele havia sido removido para uma unidade ainda mais brutal do sistema penal russo devido ao aumento de seu tempo de cadeia, em agosto passado.
Naquele julgamento, ele pegou mais 19 anos de prisão, elevando sua pena total a 30 anos e meio. O ativista disse que era vítima de uma armação stalinista, em referência aos julgamentos farsescos dos tempos do ditador soviético Josef Stálin (1878-1953).
Isso ocorreu porque ele foi designado um extremista, algo grave na lei russa, sob acusação de fomentar práticas do gênero em seu Fundo Anticorrupção, entidade que denunciava malversações de funcionários do governo de Putin.
Ele já estava preso desde 2021, quando voltou da Alemanha após tratar os efeitos de um envenenamento sofrido na Sibéria em 2020, quando participava de uma campanha eleitoral local. Ele acusou Putin diretamente pela ação e consolidou sua posição como mais conhecido opositor do líder russo, no poder desde 1999.
Desde sua prisão, que gerou uma onda grande de protestos reprimida pela polícia, Navalni cristalizou no exterior sua imagem de grande opositor russo. Dentro da Rússia, após uma surpreendente boa votação na campanha para prefeito de Moscou em 2013, que lhe deu o segundo lugar, nunca teve a mesma projeção eleitoral pesquisas eleitorais lhe davam usualmente menos de 5% de intenções de voto.
Ainda assim, por meio de uma engenhosa rede de ativismo online, incomodava o Kremlin. Em 2017, organizou protestos com milhares de pessoas em diversas cidades russas que eram convocados pela internet e se dissolviam logo que a repressão começava. Na Rússia, qualquer ato com mais de uma pessoa precisa de autorização para ocorrer.
Em 2018, ele tentou concorrer à Presidência, mas foi barrado devido à primeira condenação que havia sofrido, acusado de malversação de recursos num obscuro caso paroquial. Essa sentença foi suspensa, só para ser retomada em 2021, quando ele desembarcou em Moscou após o tratamento pelo envenenamento.
Virou ícone no exterior, com um documentário hagiográfico acerca de sua vida se tornando vencedor do Oscar no ano passado. Com a Guerra da Ucrânia, o aumento da repressão ao dissenso na Rússia levou ao estrangulamento de sua rede de apoiadores muitos, como Iarmich, foram para o exílio.
A morte de Navalni será colocada, pelos opositores de Putin, na mesma galeria de incidentes com pessoas que desafiaram o poder do Kremlin sob o comando do presidente. Houve assassinatos nebulosos, como o da jornalista Anna Politkovskaia em 2006 e do político Boris Nemtsov, em 2015, prisões e exílios.
O Kremlin nega relação com os casos, que segundo alguns observadores podem não ter sido ordenados por Putin, mas executados por pessoas ligadas ao esquema de poder vigente. Seja como for, a morte de Navalni ainda carrega o simbolismo de ocorrer um mês antes da eleição que irá reconduzir Putin a mais um mandato de seis anos à frente da Rússia.
FONTE: FOLHA DE S.PAULO